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Publicado: 01 Março 2016
Quase um ano após SVB e parceiros conseguirem assegurar a aprovação da Lei Municipal Nº 16.222 / 2015, que proibiu o comércio de foie gras e de peles de animais na cidade de São Paulo, a prefeitura publicou no final de março deste ano um Decreto regulamentando especificamente a proibição do comércio de peles e atribuindo à Secretaria de Verde e Meio Ambiente (SVMA) a responsabilidade de fiscalizar. Algumas semanas depois, contudo, a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (ABICALÇADOS) entrou com um pedido de liminar junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP), que acabou sendo atendido pelo Desembargador Sergio Rui em decisão do dia 26 de abril.
O Desembargador Sergio Rui é o mesmo que, em fevereiro deste ano, garantiu a decisão definitiva do TJ/SP suspendendo os efeitos dessa mesma lei municipal, mas especificamente no tangente à proibição do comércio do foie gras, a pedido da Associação Nacional de Restaurantes (ANR) - processo no qual a SVB ingressou como amicus curiae (parte interessada). Com a nova decisão suspendendo também os efeitos a respeito do comércio de peles, o Desembargador e o Tribunal de Justiça do estado completam a destruição de uma das leis mais promissoras da história do Brasil para os direitos dos animais.
A Lei do foie gras e das peles havia sido sancionada em 2015 pelo prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, que se demonstrou sensível à proposta após receber de ativistas um abaixo-assinado com cerca de 100 mil assinaturas.
A decisão que suspendeu a proibição do comércio de foie gras foi definitiva e, agora, resta apenas o recurso ao Superior Tribunal Federal (STF), processo este que será mais moroso e pode demorar alguns anos para uma decisão final. A decisão que suspendeu a proibição do comércio de peles, por sua vez, foi liminar, isto é, temporária, até que seja inteiramente julgado o mérito do processo. Até a última atualização na redação deste artigo, em 12 de julho de 2016, o julgamento não havia ocorrido ainda - o que significa que há chances de que a proibição das peles volte a vigor num prazo mais curto. Porém, especialistas ouvidos pela SVB analisam que, diante da conclusão do TJ pela suposta inconstitucionalidade da proibição do comércio de foie gras, a tendência é que o julgamento das peles no estado siga o mesmo caminho.
Em reunião com a Prefeitura em março deste ano, a SVB e parceiros foram recebidos pelo Secretário de Negócios Jurídicos da prefeitura, Dr. Robinson Barreirinhas, que garantiu que a prefeitura tem recorrido das decisões do TJ e que está empenhada em manter os efeitos da lei que sancionou.
Luciane Zillmer (OAB/SP), Guilherme Carvalho (SVB), Sandra Limande Lopes (OAB/SP e HSI), Robinson Barreirinhas (Secretário de Negócios Jurídicos da Prefeitura) e José Roberto Strang (Procurador do Município).
Conforme o texto da lei sancionada, se voltar a vigor, a proibição será aplicada ao couro de animais "criados exclusivamente para a extração e utilização de pele", não atingindo portanto o comércio de couro bovino. Seria proibido, assim, o comércio da maioria dos chamados “casacos de pele” e similares - incluindo vison, chinchila, raposa, coelho, etc.
A DISPUTA PELA PROIBIÇÃO DO FOIE GRAS
A disputa pela proibição do foie gras ("iguaria" francesa, símbolo da crueldade extrema contra animais, que consiste no fígado hipertrofiado de gansos e patos alimentados à força) começou em 2015, após a sanção da lei de São Paulo, quando a Associação Nacional de Restaurantes (ANR) interpôs recurso junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) afirmando que a legislação seria inconstitucional, alegando que "a proibição da fabricação e/ou comercialização de determinado produto é matéria sujeita à competência legislativa concorrente da União e dos Estados federados”.
Veja o abaixo-assinado online pela proibição do foie gras: www.change.org/foiegrasnao
Diante do recurso, a Prefeitura elaborou sua defesa argumentando que, antes de relacionar-se ao comércio, a lei trata de "matéria ambiental, relativa à proteção da fauna (…) e contra a crueldade" - o que, conforme a Constituição Federal, é matéria de responsabilidade do município também. A SVB endossou a posição da Prefeitura, e complementou: ”A ANR não é um conselho de classe, não representa todos os restaurantes. E, mesmo assim, há uma série de restaurantes associados à ANR que não concordam com essa posição da associação", disse na ocasião Guilherme Carvalho, secretário-executivo da SVB.
Porém, no final de fevereiro de 2016, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) julgou o processo e - a despeito de contundente argumentação oral feita por uma Procuradora do Município na ocasião - acatou por unanimidade o recurso da ANR. Isso significa que a proibição do comércio defoie grassegue suspensa em São Paulo.
Contra a decisão do TJ/SP, a prefeitura apresentou dois tipos de recursos: primeiramente um Embargo de Declaração, pedindo maiores explicações e esclarecimentos ao Desembargador Sérgio Rui, responsável pelo processo, sobre a fundamentação da sua decisão; e, em segundo lugar, um Recurso Extraordinário, que leva o processo para "cima", ou seja, para ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília.
“Embora a tendência seja o julgamento do STF demorar bem mais, estamos diante de uma chance de conseguir uma proibição nacional desta iguaria da crueldade chamada foie gras. Temos uma fundamentação jurídica consistente para defender a constitucionalidade e relevância da proposta e assim brigar pela vitória em Brasília”, afirmou o Dr. Ulisses Borges de Resende, Diretor do departamento jurídico da SVB. A SVB faz parte do processo do TJ/SP após ter sido admitida comoamicus curiae(parte interessada).
Em outros locais de todo o Brasil, projetos de lei e mobilizações da sociedade civil surgiram desde que a disputa começou em São Paulo. Leis municipais proibindo o comércio de foie gras já são realidade em Blumenau (SC), Sorocaba (SP), Santa Bárbara D'Oeste (SP) e Aparecida (SP). Em Goiânia (GO) e Belo Horizonte (MG), leis foram aprovadas nas respectivas Câmaras Municipais e, na data da última atualização deste artigo (12 de julho), estavam pendentes apenas da assinatura do prefeito para entrarem em vigor. Em outros inúmeros municípios e alguns estados, a Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB) e o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal (FNPDA) estão acompanhando projetos de lei em tramitação visando proibir esta iguaria da crueldade - até que ela seja proibida em todo o Brasil.
Entenda neste vídeo a crueldade inerente à produção de foie gras.
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